Estamos no princípio do séc.XX,talvez em 1911 ou 1912.
Numa pequena e pobre aldeia do concelho de Oliveira do Hospital,Hermínia vem do campo.Cântaro da água à cabeça e foice na mão.
Vem com pressa para casa.Tem lá a prole para alimentar e a mais nova ainda é menina de colo.
Quando se aproxima de casa fica mais tranquila.
A égua,presa na argola,indicava que o homem já tinha chegado.
Poisou o cântaro e a rodilha e foi ver de que precisava o homem.
Este,com as suas melhores roupas,já saía do quarto com a caixa de madeira na mão.
Disse-lhe que ia embora,estava com pressa e que nunca mais se veriam.
Nem um beijo de despedida...
Hermínia,atónita,nem sabia o que se estava a passar...
Dias,semanas,ali ficou com os 5 filhos.
A primeira notícia veio de um parente que lá foi a casa.
Trazia-lhe 50.000 reis,produto da venda da égua,que o homem deixou dito que eram para ela...
Naquela aldeia,com agricultura de subsistência,Hermínia fazia contas à vida,rezava,trabalhava nas terras e,acima de tudo,pensava nos filhos.
O mais velho,rapaz de 14 anos,era dado às letras:gostava de ler e escrever(tinha feito a 5ª classe),aprendia com o padre na igreja mas não queria ir para o Seminário.
A seguir,uma rapariga de 12 anos que fazia de tudo em casa:tratava da comida e da roupa dos irmãos.
Mais 2 filhas,uma de 10 e outra de 5...
E o rebento mais novo,um rapazito franzino de 4 anos.
Nas lojas,já não havia porcos nem ovelhas.
A junta de bois também foi vendida.
Deixou de se fazer vinho e apenas se "emprestava" o lagar de azeite.
As coisas estavam a piorar.
Então,Hermínia decidiu:os rapazes tinham que ir ganhar a vida.
Através de uns parentes,os rapazes embarcaram para o Brasil.Por lá estiveram uns anos e aprenderam que para ganhar a vida,da maneira que entendiam,o rumo seria a Argentina.
Das filhas,como era costume na época,Hermínia decidiu que a do meio permaneceria solteira e seria a guardiã dos mais velhos e dos mais novos.
A filha mais velha,a segunda em idade,também rumou ao Brasil em busca de uma vida melhor.
Conseguiu-o,mas nunca voltou a Portugal.
As duas filhas mais novas por cá ficaram e a do meio sempre cumpriu a sua missão:zelar pela família.
Zelou por Hermínia,sua Mãe,até à sua morte.
Zelou pela irmã mais nova até à morte desta.
Zelou por sobrinhos e afilhados,até falecer com 96 anos.
Hermínia,sempre com uma dignidade muito grande e com a estima de toda a aldeia,faleceu aos 84,depois de ter recebido a visita dos filhos e ter a certeza de que estavam bem na vida.
Das filhas,também sabia que a mais velha(no Rio de Janeiro) tinha a sua família constituída e tinha uma vida muito digna.
Das mais novas teve conhecimento directo,até falecer.
Neste dia,a minha heroína é a avó Hermínia.
1 comentário:
A minha homenagem às mulheres de fibra cuja dignidade e verticalidade mesmo no anonimato se afirmam.
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