domingo, 27 de fevereiro de 2011

SERRA DA CAPIVARA

Recebi a incumbência de fazer uma pesquisa sobre a Serra da Capivara. Fiquei preocupado porque este recanto, protegido pela UNESCO, é praticamente desconhecido por aqui. Eu mesmo, que morei um tempo no Piauí, não sabia de sua existência além do aparece em cadernos de turismo, que leio poucas vezes.
Eu poderia falar do Piauí um pouquinho, aquelas piadas velhas com sua vizinhança, uma política terrivelmente a favor das elites proprietárias de terra ou grandes comerciantes, uma vez que o estado não tem indústrias suficientes para se chamar de "parque industrial". Eu morei num oásis, a cidade de Parnaíba, antiga capital até que o Rio Parnaíba fosse substituído pelas estradas e Teresina surgiu para ser a única capital do Nordeste que não está à beira mar. É como um único ponto de abastecimento no meio da Europa. Um calor tremendo e uma cidade sem encantos, projetada para funcionar, como um escrtitório de fábrica. Só que não sabiam como era uma fábrica. 
Parnaíba não é uma cidade litorânea, é fluvial. Fica no delta do Rio que lhe batizou, um paraíso ecológico que faz fronteira com o Maranhão. São dezenas de ilhas, uma paisagem linda. Para  ir à praia, rodamos alguns quilômetros pela Ilha Grande de Santa Isabel para chegar à Pedrta do Sal, que divide duas praias, uma de ondas e barrenta como o rio e outra uma pequena enseada, águas límpidas e calmas. Entre elas, um bar onde se come belos tiragostos de pescada amarela, carangueijos, camarões... E cerveja quente. A gente acostuma com tudo quando criança...Ou no sentido oposto, na direção do Ceará, com mais cinquenta quilômetros de praias lindas a partir do município vizinho de Luís Correia. Minha preferida era a praia do Coqueiro, que durante boa parte do ano ficava sem acesso por causa de uma duna que invadia a estrada.Em 1980 só tinha uma aldeia de pescadores, em cujas moradias podíamos comer peixe frito da melhor qualidade, e cerveja quen...Deixa pra lá.
O idioma falado é o Português NE, misturado com o francês dos rapazes das famílias abastadas cuja educação, durante o século passado, era na Europa. Quando, numa conversa de tiquira e cerveja, observei que era muito chique a alta sociedade parnaibense, fui corrigido: não era bem o que eu estava pensando. Era mais barato mandar os filhos para estudar na França do que no Rio ou Sumpaulo! No que completei: e passar férias também!
Foi interessante o tempo que passei lá, aprendi muito com os costumes locais, fui capturado definitivamente pelos peixes na dieta - o que faço até hoje - e o gosto por uma rede, que me serviu de cama numa temporadinha no sertão - trabalhei no município de Cocal, onde até no único pouso da cidade se dormia na rede. Não tive curiosidade de perguntar mas acho que cama mesmo só no bordel. 
O Parque Nacional da Serra da Capivara fica a uns 800 km de Parnaíba, tomando-se uma estrada imaginária, uma reta fumegante atravessando a caatinga, sertão a dentro, até perto da fronteira de Pernambuco. Como se poderá ver nos vídeos que publiquei aqui, o caminho melhor é a partir do Recife. Mas é lindo! Um paraíso ecológico e suas pinturas rupestres e achados arqueológicos vão acabar desmentindo tudo e afirmando que a vida começou bem alí! Tudo o que consegui a respeito dele foi na Internet, basta fazer a busca no Google. Apesar da vida rude do sertao, passar alguns meses por lá me fariam muito bem à saude física e mental. Quem sabe?


6 comentários:

Maria disse...

Texto lindo ! Do ponto de vista literário e do quanto ensina o contexto a quem está de fora! Dá uma vontade imensa de ir conhecer, mais do que o Parque, a paisagem e as pinturas, toda a região piauienha (era assim o adjectivo, não era?).
Mesmo que a cerveja continue quente (sempre quis experimentar o sabor da expressão "cerveja morna" dos livros do Astérix :-))

Todo o contexto serve para entender a presença da directora no local, a Niède Guidon (de ascendência e formação francesa). E um pouco do que diz nesta entrevista também http://noticias.ambientebrasil.com.br/entrevistas/2005/11/13/21674-entrevista-exclusiva-niede-guidon.html
http://www.youtube.com/watch?v=ZxrVDNG6hAI

obrigada Gerson. Pelo momento bonito e pelo conteúdo! :-)

Gerson Deslandes disse...

Muito obrigado, Maria, pelo elogio ao meu texto. Acho um pouco exagerado, mas fica por conta de nossas afinidades literárias... O que posso reafirmar é que o nordeste do Brasil sempre me atraiu, sua cultura, seu idioma peculiar, sua forma de falar. Nem tudo é paraíso, nem tudo é inferno, não é mesmo? Vou postar mais algumas coisas que observei por lá. Como eles gostam de dizer, devagar...

Maria disse...

Na lentidão e na interioridade, parece-me que o NE do Brasil deve ter algumas afinidades com o Sul de Portugal. No fundo, tudo acaba por resultar em qualidade de vida, creio.
:-)

aminhapele disse...

Está tudo dito,Gerson.
Obrigado.
Um abraço.

Manuela Curado disse...

Foi com um sentimento de saudade que li entusiasticamente o texto.
Não estive nas terras enunciadas, mas bem lá no norte do Brasil em terras de Maranhão, abraçada em seus Lençois.
Tudo me fez lembrar umas das férias mais lindas da minha vida.
O adormecimento na rede ouvindo o silêncio da noite. O brilho diferente das estrelas. As horas vividas em dolência e apaziguamento profundo. O peixe frito gostoso em casa de desconhecido. A afabilidade das gentes. Os banhos no rio. O calorzinho dengozo. A despreocupação do vestuário e a alegria permanente no ar.
Será ali o paraíso, meu irmão?

Franco disse...

Sou parnaibano, e vim para o sul quando tinha 12 anos e nunca mais voltei.
Aquele Lugar é um paraíso na terra, por muitos desconhecidos.
O meu maior sonho, não é conhecer outros países, eu quero apenas conhecer o meu Piauí querido, que com certeza os anos de vida que ainda me restam, serão poucos.

Franco.