quarta-feira, 4 de março de 2009

O INDUSTRIALISMO NO ENSINO

Um facto universalmente reconhecido é a progressiva ignorância das gerações que o ensino oficial vai preparando.Antigamente,ensinava-se pouco e arcaicamente;mas ao menos êsse pouco ficava-se sabendo.Hoje fica-se ignorando,porque se pretende ensinar muito,à moderna,mas contraproducentemente.Hoje não se ensina para saber:ensina-se para fazer exame.
O industrialismo,predominante em tudo,é também absoluto no ensino,e medra tanto mais,quanto mais disparatada é a relação entre os programas,os professores e os compêndios.
Em Portugal não se exagera a quantidade de ensino da instrução secundária e primária:basta para isso comparar os magros compêndios de história dos nossos liceus,com os livros de instrução secundária da Alemanha ou da Inglaterra;basta contrapor os nossos resumos de história pátria e geral,por exemplo,aos resumos de Hume,de Merivale,de Smith,livros admiràvelmente feitos,e que sem ofensa se pode afirmar excederem até a capacidade da nossa instrução superior.
Não é portanto o exagêro da quantidade o nosso mal:é o avariado da qualidade.É o disparate entre os programas,os professores e os compêndios.
Os programas fazem-se à priori nas secratarias;mas os professores não se inventam com igual facilidade:pelo contrário,a negregada política parece apostada a fazer baixar ainda mais o nível abatido a que,naturalmente,pela fôrça das cousas e pelo estado da nossa instrução superior,está condenado o professorado do secundário português.
Enquanto não houver uma escola normal superior,não haverá professorado para os liceus.Parece que se pensou em transformar numa escola dêsse género o Curso Superior de Letras,e sem dúvida alguma era êsse o destino útil que se lhe podia dar.Seria o único modo de erguer o nível do magistério e de acabar com o industrialismo professoral que é a praga mais esterilizadora da mocidade condenada aos cursos dos liceus.
Respeito a questão dos compêndios,em que o industrialismo é tão grande,se não maior ainda,o remédio parece fácil e óbvio.
Não se compreende como o Conselho de Instrução Pública aprova para o ensino,simultâneamente,essa quantidade indigesta de livrecos,na maioria dos casos imbecis,e que frequentemente jogam entre si as cabeçadas.
A indústria dos compêndios escolares viça à custa dos cérebros das crianças e das algibeiras dos pais.Lembra-nos ter visto uma vez um aluno de inglês que tivera de gastar num ano 8.500 réis de gramáticas,selectas,etc,para atender as exigências do professor do seu curso!
Démo-nos ao trabalho de ler a máxima parte dos compêndios escolares,e a êsse respeito prometemos aos leitores do Repórter surprêsas singulares.
Pois bem:salvo melhor juízo,parece-nos que a questão dos compêndios se resolvia fàcilmente estabelecendo a regie.Compêndio aprovado seria exclusivamente um,escolhido e comprado pelo Estado,por êle vendido ao preço de custo aos alunos.
Acabava dêste modo a indústria,uniformizava-se o ensino,diminuia-se o pesado tributo lançado às famílias por uma instrução que só nominalmente é gratuita.
De António Sérgio
in Repórter,19-VIII-88
Este texto só tem 120 anos...
Pode haver uma "gralha":em vez de 88,talvez 08.
Mas,no meio disto,o que são 20 anos??!!
O erro é pequeno!
O autor do texto é Oliveira Martins.
As minhas desculpas.


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