Voltando à vaca fria, as lagartixas eram abundantes no nosso prédio. E eram alvo para nossas disputas de pontaria, assim como os lagartos e camaleões que tomavam banho de sol na pedra e precisávamos de visão aguçada para descobri-los. A sorte era que eles gostavam de mudar de lugar, talvez para ir ao banheiro. Então, tínhamos alguns segundos para atingi-los com qualquer coisa que tivéssemos na mão: espingardas, atiradeiras, pedras... Quem acertava um ganhava pontos na hierarquia da molecada.E daí? Daí que a pedreira foi vendida e sobre ela foi construído o Shopping Leblon. Que conseguiu transformar o pacato bairro de final de litoral em inferno urbano. Gente pra todo lado, imóveis super-valorizados, moradores de rua, camelôs, ruas entupidas de carros, ônibus, caminhões e táxis. Tá certo que em matéria de comércio e cultura melhoramos um pouco, mas se ganhamos livrarias, perdemos cinemas, quitandas viraram supermercados, pequenos serviços disponíveis a cada esquina estão dando lugar a lojas de roupas, farmácias ou botequins paulistas. Hoje, nos 15 quarteirões da Avenida Ataulfo de Paiva, a principal do bairro, sobrou apenas uma padaria de verdade, que até já andou fechada pelos fiscais da Saúde Pública. Ao seu lado temos uma delicatesse de pães, não se pode chamar de padaria. É uma delícia mas não é uma padaria! Não tem sonhos de creme! E diversos cafés. E farmácias. E sorveterias de iogurte. O Shopping Leblon trouxe para cá as mais famosas grifes do mundo da moda. Os "tênis de marca", que já foram motivo de assaltos a crianças. Os motoristas engarrafando o bairro atrás de uma vaga para deixar sua arma, quer dizer, seu automóvel. O Consumidor tem dinheiro para vir de carro mas não quer pagar o estacionamento dentro do shopping. Fica vagando e atravancando as ruas. E o mais incrivel de tudo isso, é que o bairro que era basicamente de casas, ruas residenciais, pequenos comerciantes que, geralmente, eram também moradores, virou o metro quadrado mais valorizado do Rio de Janeiro, a praia mais cheia, as lojas mais caras... Mas continua ótimo.
Esta semana refiz a trilha da madrugada, visitando os bares que sobraram e que há muito tempo frequento, agora mais de dia do que de noite. E foi a mesma delícia de 40 anos atrás! Guiado por um bebunzinho, grande músico que conhece todo mundo, descobri que ainda tenho conversa para muitas madrugadas, com muitos malucos que frequentam o lado oculto da Lua. Num dos bares percebi uma lagartixa na parede. Não disse nada pra ninguém, poupei sua vida. Mas ai dela se caisse no meu copo de chope! O Leblon dos anos 60 - www.almacarioca.com.br
2 comentários:
Ah, que saudades daqueles tempos tranquilos desde o Leblon até a zone norte do Rio!
Lagartixas sempre me fizeram medo, sei lá, um nervoso estranho, parecem que vão despencar sempre em cima da gente. Hirrc!
Belo texto!
bjs cariocas
Mais um belíssimo texto,querido amigo.
Peço-te desculpa pela falta de notícias.A preguiçar,na Póvoa de Varzim,resolvi dar alguns dias férias ao teclado.
Amanhã ou depois regressarei à actividade mínima.
Um grande abraço.
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