quinta-feira, 6 de novembro de 2008

A LIGAÇÃO DE LISBOA COM A MARGEM ESQUERDA





Os Caminhos de Ferro do Sul e Sueste,pertencentes ao Estado,chegaram a ter uma administração modelar que permittiu o seu desenvolvimento.Mais tarde,com a restricção da sua autonomia e portanto interferencia mais directa dos poderes publicos na sua administração,interferencia sempre prejudicial,deixou de se seguir na ampliação da sua rêde uma orientação bem definida,do que resultou termos ainda hoje,para servir toda a importante região do sul do Tejo,850 quilómetros,dos quaes alguns pequenos ramaes só prejudicam a exploração.Entretanto está por concluir o ramal Ermidas-Sines que servirá as importantes minas de Aljustrel e Sousal,e por fazer a ligação da nossa rêde com a hespanhola,de quem ultimamente tanto se tem falado,e tambem a ligação com a rêde da Companhia Portuguesa em Ponte de Sôr,o que possivelmente não será muito do agrado d'esta Companhia.
Quanto à ligação directa com Lisboa,procurou fazê la a Companhia Portuguesa,em seu beneficio,construindo a linha Setil-Vendas Novas,pela qual esperava fazer o trafego entre Lisboa e o Sul.Essas esperanças porém falharam,pois por aquella linha se faz quasi exclusivamente o trafego entre o norte e o sul do paiz,não tendo sofrido desvio sensível o trafego das linhas do Sul e Sueste.
Quanto á ligação directa com Lisboa,foi o falecido engenheiro Miguel Paes,entusiasta partidario da construcção da ponte Montijo Xabregas,sobre que chegou a fazer estudos que agora serviram de base ao projecto de lei sobre que o Parlamento ainda se não pronunciou.
Embora a ideia da construcção da ponte Montijo Xabregas seja antiga e represente a unica solução aceitavel da ligação com Lisboa e portanto com as restantes linhas do paiz,o certo é que essa ideia foi durante annos posta de parte visto ter-se pensado na construcção de uma grande estação fluvial em Cacilhas,até onde seria prolongada a linha que então terminava no Barreiro.
Segundo o projecto aprovado,a linha,para uma unica via,seguia desde o Barreiro á margem do rio,cujas águas lambem o Aterro,que é protegido na sua maior parte por um empedrado,mas que,apesar d'isso,está sujeito a ser seriamente damnificado,senão cortado no inverno.
Tem duas pontes com um tramo levadiço,uma já construida entre Barreiro e Seixal e outra de que estão apenas construidos os pilares a seguir á estação do Seixal.A estação,muito ampla,assentava completamente em terrenos conquistados ao rio e destinava se a todo o serviço,inclusive o da carga de minerio,para o que se projectavam installações especiaes.
A construcção d'esta estação teria a vantagem de reduzir muito a travessia do Tejo,que não demoraria mais que 10 minutos e se poderia fazer com todo o tempo,o que hoje não succede,pois com nevoeiros densos,felizmente pouco frequentes,torna-se perigosa a navegação no canal dragado e balisado,que dá accesso ao Barreiro.
O traçado Barreiro-Cacilhas foi pouco feliz,como se observou na construcção do troço Barreiro-Seixal,já sem exploração.A construcção está parada e,a recomeçar,terá naturalmente de se fazer uma variante que,partindo do Seixal,passe em Arrentela e contornando o braço do rio vá ligar ao traçado pouco antes de Caramujo,evitando-se assim a difficuldade da ponte a seguir a Seixal,a qual,para não embaraçar a navegação,precisava de uma grande secção de varão e tambem d'um grande tramo levadiço.A fazer-se essa variante seria conveniente estudar se não valeria a pena fazer uma outra que,passando por Lavradio e Paio Pires,ligaria a que já apontamos,constituindo a variante que vae indicada no desenho.Abandonar se hia assim a parte já construida,de difficil conservação e muito inconveniente por causa da ponte,á navegação.
A estação do Barreiro é acanhada,mas a sua deficiencia provém principalmente da sua defeituosa disposição e o serviço torna-se particularmente deficiente na carga do minerio e descarga do carvão,já por o canal de accesso limitar a tonelagem dos navios que ali vão carregar ou descarregar,já por haver ali apenas uma ponte acostavel,já tambem por não haver disposições adequadas que facilitem este serviço.
Concluida a ponte de Alcacer,o que deve succeder este anno,acaba-se a interrupção da linha do valle do Sado(Setubal-Ermidas-Funchera) e então,desde que Setubal oferece boas condições,é natural que o minerio do Lousal saia por ali,procurando assim o menor percurso e mais facilidade de carga.
Tambem logo que esteja contruído o ramal Ermidas-Sines,cuja construcção vae relativamente adeantada,e feitos que sejam alguns trabalhos no porto de Sines,natural é que por esse porto se faça a exportação do minerio do Sousal e tambem de Aljustrel,mesmo que se não construa a linha Aljustrel-Ermida.
Assim,num futuro mais ou menos proximo,a saída do minerio ou pelo menos a sua maior parte,deixará de se fazer pelo Barreiro por onde naturalmente e por esse motivo se deixará de fazer parte da importação de carvão.Quer dizer:é de prevêr que o trafego do minerio e carvão no Barreiro venha a diminuir consideravelmente num futuro mais ou menos proximo.
Sendo assim,e sendo tambem de esperar que a ponte Montijo Xabregas se venha a construir,não se vê grande necessidade em concluir a linha de Cacilhas ou pelo menos em construir a estação com a importancia que o projecto lhe atribuia.
Além da estação de Cacilhas projectava-se na margem direita uma nova estação fluvial para passageiros e que ficaria no terrapleno em frente da Alfandega,acabando-se com a estação actual do lado do Arsenal,que é imprópria d'uma cidade como Lisboa.
Já em 1906 o eminente engenheiro Adolfo Loureiro - Os Portos Marítimos de Portugal- dizia que ella estava estabelecida num logar acanhado e imundo,anti-hygienica para o trafego.A estação é de madeira assente sobre estacaria e não tem sofrido qualquer modificação.
Dada a impossibilidade de,naquelle local,se fazer obra definitiva por oposição das auctoridades da marinha,pensou-se já na sua construcção no terrapleno da Alfandega que aliaz não é aproveitado por esta,nem aproveita ao comercio,visto não poderem ali atracar navios em virtude do muro que derruiu.Pois apesar d'isso Alfandega e comercio fizeram tal oposição que nada se conseguiu.
Ainda no fim do anno findo se tentou a construcção da estação naquele local que,apesar de se reconhecer pertencer aos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste,não lhe é entregue,nada se tendo conseguido.
Não conseguimos ainda obter o perfil do rio no ponto em que se projecta a ponte Montijo-Xabregas,nem planta com sondagens.Pelo que se diz,porém,as fundações dos pilares não oferecem dificuldade.Em vista d'isso,da sua menor altura,a sua construcção deve ser menos dispendiosa que a da projectada ponte entre Santos e Almada,embora a superficie dos seus taboleiros venha a ser maior aproximadamente um terço,que a desta ultima.
E assim,se o orçamento d'esta foi bem estabelecido,a ponte de Montijo,ao cambio actual,não deve ir alem de 220 mil contos,importancia esta que de modo algum é de natureza a inutilisar a ideia da construcção,cujo accesso na margem esquerda seria facilmente feito pelo prolongamento do ramal de Aldegallega.Na margem direita conviria,a nosso vêr,ligà-la à linha da Companhia Portuguesa,de modo a que o serviço de passageiros se fizesse numa estação central,proxima ao Terreiro do Paço,conforme està mais ou menos projectado.Seria contudo conveniente estabelecer uma estação privativa servindo a cidade,embora estabelecida em local um pouco excentrico para a não tornar tão dispendiosa.Seria assim - e não tenho duvida que mais tarde ou mais cedo a ponte de Montijo será uma realidade - e em vista do que se disse àcerca do trafego futuro no Barreiro,parece-nos bem desnecessaria ou pelo menos de pouco interesse a conclusão da linha de Cacilhas e sobretudo a construcção da estação projectada.
Como,porém,a ponte levará alguns anos a construir e a situação actual não se deve manter,conviria modificar convenientemente a estação do Barreiro e construir a do Terreiro do Paço,com o que se dispenderia não mais de 10 mil contos,importancia actualmente suficiente para se fazer as obras necessarias para um serviço regular,emquanto se não construísse a ponte,na hipótese,é claro,de que a sua construcção não fosse sempre adiada.
Trabalho do Engenheiro Avellar Ruas,publicado em Agosto de 1924



1 comentário:

Anónimo disse...

Qual Avellar Ruas, qual estória!
"JAMAIS"

1924?
No tempo da I República?
Não mangue connosco.

"Bom projecto só houve um
o do Lino e mais nenhum". Percebeu?
E este da II República (já que entre 26 e 74 houve um intermezzo com o regime anarco-monárquico de Salazar). Entendeu?

Vamos lá refazer essas contas... E a Lino o que a Sócrates pertence.

Disse.

mc