sábado, 1 de novembro de 2008

A MISÉRIA COMO PRODUTO DE CONSUMO


O programa da Hebe Camargo, bastião da cafonice na televisão brasileira, apresentou esta cena, em que se explora a manifestação política de uma pessoa com deficiência de fala - a popular gagueira. É quase impossível, na primeira vez em que se assiste, não rir do lamentável espetáculo. Mesmo sendo um quase ex-gago (ainda dou minhas derrapadas), eu ri quando assisti no computador. E não é só esse, já vi outros com a mesma temática. Esse tipo de "atração" faz parte da decadência cultural de uma sociedade cada vez mais depreciativa dos valores humanistas, escalada que acabou gerando a falência econômico-financeira do neoliberalismo, faceta mais perversa do capitalismo já apresentada. A personagem do filme, pessoa humilde, orgulhosamente, corajosamente, aproveita a chance que lhe foi dada para fazer uma manifestação política, uma crítica de cidadã com relação à qualidade dos serviços que o poder público local apresenta aos eleitores. Alguém ouviu? Não, ficamos todos esperando a próxima topada em sua oratória. A apresentadora (e seu auditório) morre de rir, chega a incentivar a locutora a falar mais, para orgasmo da audiência. É a miséria como espetáculo. Não se trata apenas de condições de vida material, a miséria física, a miséria cultural, a miséria mental, todas fazem parte desse grande circo em que transformamos a vida conectada. A deficiência como produto, que me recuso a chamar de cultural, como os intelectuais da área chamam o turismo que leva o estrangeiro a visitar favelas e áreas carentes. Não é invenção nossa, acontece mundo a fora, desde que tenha miséria, quanto mais fatal melhor. Essa é a contribuição que a cultura da riqueza desenfreada, amoral e imoral, deixou para pessoas comuns cujas maiores necessidades são básicas ou pouco além.


4 comentários:

aminhapele disse...

Levanto-me e aplaudo o teu texto,Gerson.
Um abraço.

Gerson Deslandes disse...

Poderia escrever mais sobre isso - me irrita profundamente uma milionária como a dona Hebe Camargo, quase cem anos de vida artística, aproveitar-se desse tipo de "exotismo" para ganhar mais um pontinho na luta por audiência. Qual é a qualidade dessa audiência? Não conta o conteúdo, tudo vira número, os anunciantes atingem todas as classes de consumidores, ah, tô de saco cheio disso! Compre uma TV-LCD e leve seu saco de vômito!

Beth/Lilás disse...

Audiência? Deve ser zero, mas enquanto o chefão Silvio Santos insistir em deixar esta senhora meio esclerosada fazer tv, só vai dar isso.
abraço carioca

Leo disse...

ridículo... ainda se vc visse o resto das coisas que passam aqui... realmente, pra um país de Dorival, Tom, Vininha e Drummond essa situação nada mais é que deprimente...