Ou não seriam causas. Esta parece-me particularmente digna de nota. Pelas seguintes razões:
1. É, ou devia ser, uma causa de todos nós, os que pagamos impostos, somos portugueses e nos interessamos pela causa pública. No entanto está a ser encabeçada e levada em ombros por mulheres. Da mesma maneira que são elas quem, tradicionalmente, se encarrega de coisas tão comezinhas e desinteressantes como a gestão da casa ou a educação dos filhos. Não, não sou feminista, nem encaro os homens como alvo a abater. Até porque são, em grande medida, o fruto da educação das mães deles, portanto...
2. Os Lenços de Namorado em si, uma das peças mais genuínas da arte popular portuguesa (seja qual for o conceito que a enquadre): tive a oportunidade de ser presenteada com um, pelo meu assistente de arqueólogo preferido, em Braga, bordado pela irmã dele; eram ambos de Vila Verde.
3. O facto do lenço de namorado que está, devidamente emoldurado, na parede de minha casa, me ter sido oferecido por uma das pessoas mais bem formadas e inteligentes que conheci até hoje: essa pessoa cometeu suicídio, à coisa de uns anos, talvez por inteligência, sensibilidade e bom fundo serem qualidades difíceis de gerir na integração de uma vida real no mundo do "Cónego Melo". (Este também já falecido. De morte natural. Viveu, ainda assim, muitos anos; os suficientes para fazer dele responsável pela morte, física ou espiritual, de algumas pessoas de bem.)
4. O Museu da Arte Popular foi um produto do Estado Novo, um dos poucos museus feitos de raiz em Portugal. A Bem da Nação. Teve como consequências a condenação, pós-25 de Abril - que, em grande medida, dura até hoje - do seu fundador, pessoa de grande mérito que teve o azar de ver os seus sonhos serem concretizados pelo governo errado (como o Almada Negreiros, por exemplo, mas sem a sorte de ter uma obra que pudesse ser objecto de especulação financeira e, por consequência, redutível a damnatio memoriae). Imperavam, então, as vertentes materiais do termo cultura, aquelas que possibilitavam a exibição (da raça lusa).
5. Se a fundação deste Museu quis ser, à época, uma bandeira do prestígio da cultura portuguesa no mundo, a sua actual substituição pelo paradigma da Língua Portuguesa apenas obedece às últimas modas intelectuais do conceito de exibição. Ou seja: agora são as imaterialidades que estão na ordem do dia mas mantém-se a oportunidade política da intenção e da decisão: Exibir a cultura portuguesa. É engraçado observar como os contextos políticos se parecem assemelhar, passados 50 anos. Eu tinha 8 anos no 25 de Abril, mas há quem fosse mais velho ou tenha estudado história o suficiente para notar algumas semelhanças com o antigamente... Exageros, sem dúvida. Mas não deixa de ser sintomático. Talvez...
6. Não deixa de ser engraçado que uma iniciativa tão interessante e criativa como esta, de pura cidadania política, não tenha tido grande eco nos meios de comunicação. Um artigo no PÚBLICO, algumas postagens em blogues, pouco mais... No entanto as televisões acorrem sempre que a Joana Vasconcelos faz qualquer coisa para a Fundação Berardo, ou para a Gulbenkian. E a causa aqui é pública, mais do que "arte pela arte" (se é que isso existe). Sintomático? Talvez... Ou talvez seja a nossa natural embirração com as mães, chatas, sempre a meter o nariz em tudo. É uma maçada...
Pensem bem... Aquele Museu é, neste momento, um museu dos museus portugueses. Espero que, pelo menos, se vier a concretizar-se o projecto, não se prejudique a materialidade dos frescos que cobrem as paredes do edifício em prol de écrans gigantes que possam exprimir a imaterialidade da língua...
E eu sou adepta ferrenha dos multimédia. Mas uma língua vive-se, fala-se, lê-se, exprime-se... por isso
Se não há nada mais prioritário para gastar dinheiro em prol da cultura portuguesa, então, construa-se um Museu da Língua...
Esta é uma mera opinião. Se consegui interessar alguém pelo assunto - espero que sim! - não deixem de passar os olhos pelos links que aqui deixo, onde recolhi as fotografias acima postadas.
1 comentário:
Não é "mera",Maria.
É uma opinião séria e bem sustentada.
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