quarta-feira, 7 de maio de 2008

A MARCHA DA MACONHA

Vou logo dizendo que fui um péssimo maconheiro. A começar pela falta de habilidade manual: nunca consegui fazer um baseado. Nem tentava. Só fazia uso da medicinal graminha quando alguém enrolava o cigarrinho. Tinha gente que ficava horas treinando com tabaco recolhido de guimbas de cigarro até aprender. Não me apetecia, gostava mesmo do efeito hilariante da inhonha. De comer latas de biscoito sem parar de rir e sem saber por que estava rindo. Isso é uma das melhores sensações do mundo, é ou não é? A gargalhada da maconha é sem culpa, sem palhaços, sem acidentes com os outros, sem situações engraçadas, espontâneas ou não. Sem vítimas nem vilões. Era o riso pelo riso, o riso sem sarcasmo, pura ginástica, a gargalhada do animal que ri. Rir para esvaziar a mente. Sou fruto de descendentes franceses por parte de pai e portugueses por parte de mãe. Então sempre gostei de fumar, beber e comer. O fumar em questão era mesmo os cigarros dos bobos, inicialmente sem filtro como o Continental e o Luiz XV. Quando comecei as tentativas de parar de fumar, conheci os charutos, cigarrilhas e outros tabacos. Hoje fumo apenas estes, quando bebo. A maconha não conseguiu substituir uma garrafa de uísque de boa família, as cervejas geladas, claras e escuras, os respeitáveis tintos. Por isso não me preparei para ir à Marcha da Maconha, mesmo sendo partidário da sua liberação. Não concordo que manifestações favoráveis à venda de um baseado no botequim ou na farmácia seja um estímulo ao uso da droga. Acho que o álcool estimula muito mais, por ser um bom acompanhante, não só da comida, mas de fumos e outros prazeres. Mas também não sei se seria uma boa providência no momento atual, em que o tráfico estimula a violência dos usuários. O efeito de qualquer droga depende da consciência de quem a usa. O poeta e compositor Luis Melodia já dizia em sua canção “Pérola Negra”: se inteire da coisa sem haver engano! Não sei se estava se referindo a um baseadinho aqui, outro ali. Mas acho que o grande problema da manifestação proibida em 9 entre 10 cidades brasileiras foi o nome: “Marcha da Maconha” foi o pior que podiam arrumar. Quem não estava inteirado do objetivo da passeata ficou logo imaginando um milhão de pessoas, com baseados na mão, no domingo de manhã na Praia de Ipanema. Coisa que acontecia praticamente todos os dias nos anos 60 e 70, com flores nos cabelos, sem lenço, mas com algum documentinho, mesmo falso, pra não cair na mão da repressão. Hoje ninguém imagina outra coisa, só escopetas, granadas e, pasmem, espadas ninja nas mãos dos manifestantes. Fica muito difícil discutir liberações de costumes numa realidade como essa. Podiam ter arranjado um nome melhor, mais politizado – podiam ter pedido uma sugestão ao FHC ou a algum político que fumou, mas não tragou - talvez em inglês, como jamaicanos que também somos: Legalize. Marcha da Maconha parece coisa de marqueteiro contratado pelos traficantes para derrubar a comercialização legal de seu principal produto. Acabou motivando uma nova espécie de Marcha Pela Família, de péssima lembrança, como se a família fosse sempre uma proteção segura e infalível contra o uso da erva e nunca um dos motivos... Imagino um paizão saindo para comprar cigarros e a filhinha pedindo para trazer um baseado, pois está precisando relaxar um pouco antes da prova de, digamos, química! A indústria do cigarro ia correr para lançar suas marcas, já pensou? Baseados Jamaica, o prazer original! Comerciais com lindas mulheres e másculos rapazes com seus olhos vermelhos e aquele sorriso jeito- maryellen-de-ser, numa lancha atravessando a Baía da Guanabara. Jererês com filtros, confeccionados com aquele fumo beleza que vem lá do Maranhão. Ou vendas a granel, do-it-yourself, globalizadamente. As igrejas adaptando-se aos novos tempos, vendendo seus fuminhos sagrados e santinhos Bob Marley. Talvez eu até fumasse unzinho pra rir novamente, agora de tudo isso. Mas só se alguém apertar pra mim.

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